26 de dezembro de 2011

Querido Papai Noel

Já escrevi tantas e tantas cartas endereçadas apenas a esse nome, que hoje, depois de anos, volto apenas para agradecer. Tenho dito, principalmente para minhas irmãs e as crianças com as quais trabalho que o Senhor existe. Vejo um brilho no olhar das que esperam apenas confirmação e um ar de dúvida naquelas que tinham convicção da sua inexistência. Termino argumentando apenas que eu acredito. E se acredito, por que não me permitir escrever novamente para você?
Já pedi tantas coisas que nem me lembro. Mas sei que em nenhum Natal, o senhor deixou de aparecer. Não a presença física, mas o seu sentimento.
Andei meio pra baixo, mas não triste, apenas mais (bem mais) quieta do que costumo ser. Precisei de tempo para refletir minha vida em alguns aspectos. Tomei algumas decisões, e ainda estou carregando o peso delas. Mas a verdade é que eu adoro o Natal. Como minha família é muito grande, o Natal sempre significou, para mim, união.
É no Natal que a gente diz para algumas pessoas coisas que não diríamos em outros momentos. É o espírito natalino que nos permite chorar com um abraço que a gente ganha todos os dias. É no Natal que os presentes tem mais significado. No Natal ajudar as pessoas tem outro gosto. Ver o presente na mão de uma criança ou apenas seu sorriso com a chegada do Bom Velhinho já valem qualquer transtorno que os finais de ano sempre nos causam.
Neste Natal quero agradecer pelas coisas mais simples que ganhei durante toda a minha vida. A primeira coisa foram os olhos de meus pais, os melhores que eu poderia ter, cada um a seu jeito, e que me cuidam e me amam mais e incondicionalmente a cada dia que passa. Posso ver isso só de saber como eles falam de mim para os outros, e agradeço a cada dia, por eles serem meus pais. Eles me ensinam e aprendem. E erram muito. Mas acertam sempre que é preciso.
Depois, agradeço por um dia ter pedido a eles que me dessem um irmãozinho. A pessoa que eu achei que seria meu espelho é hoje em quem eu desejo me espelhar. O melhor homem que eu já conheci, o meu melhor amigo e, enfim, o irmão que eu sempre quis, eu ganhei quando pedi.
Como eu adoro surpresa, a vida me surpreendeu quando me deu mais duas irmãs, e junto com elas, uma pessoa muito especial que já faz parte da minha vida há muito tempo. Com novas pessoas no caminho, surgem também novos jeitos de amar. E como é bom aprender a amar diferente!
A vida (ou será que foi você, Papai Noel) também me deu avós maravilhosas, tias que me tratam como filha e primos que são meus irmãos.
Junto com a maturidade veio outro grande presente: a escolha.
Foi escolhendo que montei minha nova família, a feita de amigos, de quem quero bem, de companheiros, de pessoas que já cruzaram por aqui e deixaram marcas, outras que ainda nem se foram, mas já deixaram saudade, aquelas que ainda estão aqui, mas insistem em permanecer longe.
Foi através deste presente que pude escolher as pessoas com quem iria me relacionar, o que acharia ou não legal fazer, o curso que faria para me tornar uma profissional e o tipo de profissional eu queria ser. Aliás, que tipo de pessoa eu queria ser. Que tipo de filha, de neta, de irmã, de amiga, de colega, de mulher, de profissional que eu seria.
Hoje, escrevendo, já quase sei quem sou. Mas ainda faço coisas que me surpreendem e escrevo palavras que acho que não saíram de mim, como esta carta ao Senhor, que na verdade, eu nunca vi. A verdade é que no fundo, lá no fundo, e tendo um mínimo de memória para ver quantos presentes mais que maravilhosos a vida me proporcionou, pode acreditar: eu sei que o Senhor existe!



Por Manoela Soares (@manunsoares)

22 de dezembro de 2011

Para o ano que vem

Não vou prometer nada. Não vou entrar de branco, não vou pular sete ondas, não vou começar uma dieta nova nem fazer a lista de tudo o que quero fazer no ano novo que começa daqui há uns poucos dias. Nada disso.
Vou me permitir entrar o ano apenas bem acompanhada, com o pé direito e um copo de champagne na mão, por favor!
Não vou fazer promessas porque não sei como será esse novo ano.
Não desejo ir morar sozinha, não preciso comprar um carro agora e se desejei ano passado conseguir guardar dinheiro, esse ano quero poder usufruí-lo com saúde na companhia das pessoas que eu amo.
Para o ano que vem desejo apenas, e não prometo, ser uma pessoa melhor. Melhor para os outros, claro, mas principalmente melhor para mim. Desejo estar muito mais de bem do que de mal com as pessoas, mesmo as que me magoaram. Desejo estar de bem com a vida e com as oportunidades que ela me oferece. Desejo estar de bem para encarar, com tranqüilidade, esse verão cheio de trabalho que ainda me aguarda. Desejo estar de bem para não julgar as pessoas pela aparência ou apenas por uma atitude. Desejo entender mais as pessoas a minha volta, aceitando que elas tem as mesmas necessidades e carências que eu, mesmo que elas pareçam mais fortes. Desejo também ser forte por algumas pessoas.
Desejo um pouco mais de muita paciência. Que eu possa tolerar mais as opiniões alheias. Que eu aprenda a conviver com as diferenças e aceitar a presença delas constantemente.
Enfim, desejo que este ano seja melhor do que o ano que está acabando. E posso começar melhorando eu mesma.
Se eu estiver melhor para o mundo, acho que o mundo também estará melhor para mim!
Feliz Ano Novo, Adeus Ano Velho!



Por Manoela Soares (@manunsoares)

15 de dezembro de 2011

Eu ando sem vontade

Desculpem a demora em voltar aqui de novo. Desculpa mesmo, a quem abre o blog e espera um novo post. Não tenho postado. Não tenho tido vontade.
Não gosto muito de fazer aniversário e, pelo visto, também não gosto desse clima de final de ano. Me deixa pra baixo, meio fora de órbita, quase sem palavras na boca. E fico sem vontade para as coisas.
Ando sem vontade de escrever, de passear e de dizer as coisas que estou sentindo. Aliás, ando sem vontade de sentir. E não é por mal, e não é culpa de ninguém, mas estou vivendo uma fase completamente introspectiva: e estava precisando mesmo disso para pensar.
Estou sem vontade de fazer um doce, de ouvir uma música, de dormir e de acordar. Sem vontade de ficar lendo até mais tarde, de ver um filme bom, de ir atrás daquela amiga que não me liga. Estou sem vontade de comprar presente e de dar presente, e esse realmente não é o meu normal.
Ando sem vontade de dizer que sim, sem ânimo para dizer que não. Sem vontade de expressar a minha opinião para as coisas.
Acho que estou tentando me esconder desse natal. Desse ano que chegou e se foi me trazendo um milhão de responsabilidades e problemas, mas também conquistas e alegrias. Acho que ando não querendo brindar o ano novo, por medo do que me espera no próximo passo.
Acho que é isso. Estou vendo a vida passar de forma tão acelerada que estou com medo.
Estou vendo as pessoas fazerem e dizerem coisas que não queria ouvir e ver. E quase fico sem vontade de ser quem eu sou.


Por Manoela Soares (@manunsoares)

1 de dezembro de 2011

A baleia

Há quem diga que tudo está relacionado a ela. O que fazemos e escolhemos fazer; o que pensamos; o que vivemos; tudo. Há quem pense que é por ela, e só por ela, que as coisas fazem algum sentido na vida. Não sei se já cruzei com a minha, não sei se sei quem ela é, mas cedo ou tarde, eu acho que todos nós, encontraremos a nossa baleia. Hoje entendi que encontrá-la não é o principal: precisamos carregá-la e principalmente vivê-la, se é que isso é possível.

Essa história começou sem pretensão alguma de acontecer. Ela nem é uma história. Hoje, eu conheci a Maria Antônia. De nome lindo e sorriso farto, conversamos, eu com 22, ela com sete, e nos entendemos e desabafamos, e viramos melhores amigas em menos de um minuto. Não lembro porque começamos a conversar, não sei o que a Maria Antônia me perguntou. Mas depois de um tempo de conversa ela me disse que costumava sair muito com o pai. Que ele a levava para a floresta, que eles se divertiam muito juntos, que depois ele virou pescador e que um dia o barco dele afundou. “E foi aí que ele foi para o céu”, me disseram aqueles olhos tristes. “Mas agora tá tudo bem, eu to só com a minha mãe e o meu irmãozinho”. Respirei fundo e pensei que precisava ser forte para encarar aquela conversa que não procurei, mas que estava ali, e a Maria Antônia precisava falar com alguém. Eu precisava ser forte por ela, ou teria que simplesmente, virar e ir embora, deixando uma criança de sete anos falando sozinha. Para qualquer criança, o céu deveria ser apenas o lugar em que moram as estrelas e a lua. Nada mais.

A Maria Antônia me disse que o pai saiu para pescar no dia do aniversário dela. Há muitos anos (palavras dela). “E ele era muito bom na pescaria. Ele pegou muitos e muitos peixes. Sabe aquela parte debaixo do barco? Meu pai encheu ela de peixes. E foi pegando cada vez mais e mais e mais e mais peixes. Daí a rede ficou muito pesada porque meu pai tinha pego uma baleia. Ela era muito grande, e quando ele colocou ela para dentro do barco, ficou tão pesado, mas tão pesado que afundou, e ninguém sabia nadar. E é tudo isso”.

Para todo o sempre, a verdade sobre o pai da Maria Antônia, para mim será somente essa. Tomara que ela também acredite no que foi capaz de me dizer, para sempre. Tomara que tenha a ingenuidade de enxergar aquele simples pai pescador, como o maior de todos os heróis.

Talvez a balei dele tenha sido a própria Maria Antônia, que um dia, ensinaria a pelo menos uma pessoa 15 anos mais velha, que contos de fadas podem ser reais. Talvez a baleia dele seja essa filha, esse ser especial que vai levar uma mensagem linda por onde passar. Não acredito que tenha caído na rede dele algum dia, trunfo maior do que essa filha.


Pescamos muitos peixes durante toda a nossa vida. Também é verdade que alimentamos outros aquários. Mas um dia, nos deparamos com uma baleia. Uma baleia imensa. Todos nós. É pelo menos nisso que muitas pessoas acreditam. Um dia fazemos uma grande coisa na nossa vida, e isso justifica tudo! E só depois de termos encontrado a nossa baleia, poderemos deixar nosso barco afundar.

É assim que se muda o mundo. Com uma pequena ideia que pode ser a sua mais arriscada oportunidade. Ou você pesca, ou prefere não correr o risco. Você escolhe.

Ainda não fiz nada na minha vida que justifique minha ausência. Não quero deixar um legado, nem virar nome de rua. Mas ainda quero fazer algo grande, que me orgulhe. Quero deixar a minha baleia pelos mares, mesmo que eu não possa mais navegar. E se um dia eu encontrar um pescador no fundo do oceano, com a rede cheia, vou dizer que aprendi tudo com ele, e com uma grande e talentosa baleia, a quem ele conhece melhor do que ninguém.




Por Manoela Soares (@manunsoares)


24 de novembro de 2011

Eu espero que todos cheguem em casa

Faz tempo que tenho visto, seguidamente acidentes de trânsito. Em duas semanas já me deparei com quatro, um deles, inclusive, foi um atropelamento em cima da calçada. Não existe mais segurança – é a primeira coisa que nos vem à cabeça. Não existe mais segurança no trânsito, na rua, nem mesmo dentro de casa. Onde quer que estejamos, parece que estamos sempre correndo algum risco. Se estamos fora do carro podemos ser atropelados, se estamos dentro corremos o risco que alguém pule na nossa frente, motivo para nos incomodarmos para o resto da vida.

Mas a questão não é nem a incomodação.

Você está em casa, esperando seu marido e seu filho, depois da escola e do trabalho. Você trabalhou a tarde inteira, passou no super, comprou um monte de coisinhas boas para o café e aguarda ansiosa, a chegada dos dois. Dá uma varrida na casa, põe água nas plantas, dá comida para o cachorro, e nada deles. “Só espero que não tenham passado no Mac”, você pensa. Então você faz um chimarrão, dobra algumas roupas que já haviam sido recolhidas da corda, costura a manga de uma blusa branca, tira o sapato, põe um chinelo. Nada. Você resolve tomar um banho, tirar o esmalte velho, olhar no relógio. Eles estão bem atrasados, será que tiveram um imprevisto? O telefone toca, e quase não dá tempo de pegar a bolsa, calçar um tênis e sair pela porta.

Você convidou sua amiga para ir a um restaurante novo. Faz muito tempo que vocês não conversam sozinhas, e tem muitas novidades que precisam ser divididas. Você quase precisou escrever para não esquecer tudo o que pretende falar: do namorado, da casa nova, da viagem, do cabeleireiro, do esmalte, da linha de roupas novas, da sua depiladora genial, daquele creminho da propaganda, da saudade que sente de quem já não vê mais, da vontade de ... e seu pensamento é cortado por uma movimentação no restaurante que faz com que as pessoas pareçam formigas se movendo. Alguém parece chamar por um médico, um médico. Você é praticamente levada até a rua e então, um rosto conhecido faz seu coração disparar.

Você está voltando para casa depois de um dia cheio, com muita pressa. Você quer chegar e parece até que precisa marcar uma hora para sentar no sofá. Você está cansado, com fome, com dor nas costas, cheio de ouvir desaforo, e desconta no acelerador. Mas você não esperava que aquele senhor não fosse colocar o pisca ao trocar de faixa, e vê o mundo girar enquanto pensa “Por que eu?”.

Não faço parte de nenhum movimento pela paz no trânsito nem sou uma motorista exemplar. Tenho minhas falhas, às vezes tenho pressa, às vezes falta paciência, às vezes sobra ilusão de que nunca vai acontecer. Um dia acontece. Pode acontecer, quero dizer. E ninguém está preparado.

Eu quero chegar em casa. Eu quero que minha família chegue em casa. Não quero receber, por telefone, a informação de que houve um acidente envolvendo alguém que eu amo. Vamos ser mais prudentes, vamos andar mais devagar, vamos usar os espelhos.

Se você não fizer isso por você, faça por quem te ama e espera ansioso, a sua chegada.



Por Manoela Soares (@manunsoares)

16 de novembro de 2011

Nossos três anos

Eu nunca pensei em passar três anos namorando alguém. Eu pensei em viver toda a minha vida do lado de alguém, mas três anos? Nossa, três anos é muito tempo. Pra sempre é indefinido, é algo que vai durando. Três anos não. Três anos é a idade de uma criança pequena que já sabe falar, caminhar e comer com a própria mão. Três anos demoram a passar.

Pedindo ajuda para a calculadora três anos são 1095 dias, 26280 horas e (o mais assustador) 1576800 minutos.

Tudo bem que pra quem é casado há 20 anos esse número é praticamente irrisório e eu sequer me atrevo a fazer a mesma conta para esses casais. Nem é o meu propósito.

Vim registrar que, apesar de querer ficar com alguém durante a vida inteira achando que vai ser simples e fácil, nunca me imaginei completando três anos de namoro. Porque o 'pra sempre' faz parte do mesmo estágio de profundidade no qual também estão inseridos meu mestrado, meus filhos, minha casa própria e meu PT Cruiser. Mas três anos tá ali. Ali você consegue?

Conseguimos, juntos, eu e o Felipe, e não foi fácil.

Não é fácil amar alguém o tempo todo da mesma forma e com a mesma intensidade. Não é fácil estar conectado por alguém que não tenha um laço de sangue pra unir. Não é fácil estar sempre a disposição, abrir mão das nossas coisas, ouvir a música que a gente não gosta. Também não deve ser fácil me entender sempre, tentar me arrancar um sorriso quando estou de cara amarrada e aguentar meu discurso incansável de quem não pode, um minuto sequer, pensar em alguma coisa que não seja trabalho.

Não é fácil conviver e se adequar à forma como o outro arruma a casa. Às comidas que fazem parte da dispensa dele, a forma como ele tem sempre pressa depois que entra no carro.

Também não deve ser fácil conviver com alguém que não pode perder um minuto de sol, que quer acordar cedo sempre pra aproveitar o dia e que quer fazer por todo mundo, e talvez, em alguns momentos, esqueça de você.

É isso. Completar três anos ao lado de alguém é querer esse alguém diariamente. É perguntar se vamos morar em casa ou apartamento, se vamos de carro ou bicicleta, se estamos ou não com a razão. Hein? Responde?

Brincadeiras a parte, três anos é tanto tempo quanto 1 ou 2 ou 13 se queremos que dê certo todos os dias!

Feliz aniversário pra nós amor!

Esses três longos anos, passaram voando por mim.



Por Manoela Soares (@manunsoares)

9 de novembro de 2011

Eu invento histórias

É assim desde que me conheço por gente. Eu olho pra alguém e já tenho sua ficha completa na cabeça: sei se é triste, se trabalha ou procura emprego, se tem filhos, se tem amigos, se é casado. Costumo me voltar, principalmente, para as histórias tristes. Não que seja uma pessoa negativa, mas o que me chama atenção naquelas pessoas, não é o sorriso. Construo histórias de rostos tristes, de olhares vazios, de mãos apreensivas, de suspiros profundos. É a vontade de abraçar as pessoas que me faz pensar mais sobre elas. E não é todo mundo que tenho vontade de abraçar. São mesmo aqueles que me instigam saber o porque daquela tristeza que pode nem ser triste, pode ser pura invenção minha, mas que me faz pensar.
Eu conheço uma menina que não me conhece e pra quem já montei e desmontei dezenas de histórias na minha cabeça. Estudamos no mesmo colégio e, apesar de ela ser bem mais nova, seguidamente a encontrava. Ela estava sempre acompanhada do pai. Ele a deixava na escola e a buscava lá. Sempre, sempre, sempre, religiosamente. Claro que o espanto não deve ser tão considerado se eu levar em conta que todo dia, religiosamente, minha mãe também me levava e buscava, o que poderia gerar uma bela história se alguém me observasse. Mas não era só isso. Eles falavam espanhol! Meus Deus, quantos anos ela tinha? É, era uma fluência de causar inveja em qualquer marmanjona metida que estivesse observando os dois. Acho que, por nunca ter entendido também aquelas conversas, elas me interessavam ainda mais. E eu pensava neles às vezes. Naquela cena daquela filha com aquele pai, sempre. Será que a mãe dela já morreu? Morreu quando ela era pequena! Será que morreu no parto? Coitado desse pai; e ele nunca mais namorou, coisa estranha. Como ele se dedica pra essa filha. Como ele a faz rir. Acho que ele é rico. Está sempre de terno. De terno, falando espanhol com a filha e naquele carrão preto: ele É rico! Mas ele não é médico, talvez seja advogado. Será que ele é espanhol mesmo? Veio da Espanha porque a mulher era uma louca e teve que fugir com a filha? Meu Deus ... 
Será que eu sou metida? Não; acreditem. Sempre fui muito discreta e posso colocar a minha mão no fogo que eles não fazem a menor ideia de que buraco eu saí.
Acontece que a menina cresceu, o pai está com ainda mais cabelos brancos (mas ainda de terno), talvez tenha perdido todo seu dinheiro porque nunca mais o vi de carro, só a pé. Ou talvez ele só tenha optado por uma vida mais saudável já que sempre encontro os dois, ele e a filha, num restaurante vegetariano.
Ela ainda é mais nova que eu e fala espanhol maravilhosamente bem. Ele ainda não tem namorada. Ela já saiu do colégio. Ele ainda usa terno.
Acho que eles não comem carne. E tenho certeza de que, nenhum dos dois, tem ideia de que uma louca varrida se emociona e se irrita com a vida deles, sem que saiba sequer, o nome dos protagonistas dessa história, que inventou do início ao fim.


Por Manoela Soares (@manunsoares)

7 de novembro de 2011

Perdas e ganhos

A vida é feita de escolhas. Muitas vezes, ao escolhermos uma coisa, consequentemente, abrimos mão de várias outras. Mas é isso: precisamos trilhar um caminho, com nossas conquistas e dores, com nossas crenças e valores, repleto de coisas que acreditamos e não acreditamos; e é preciso que esse caminho seja pleno. Para mim, pelo menos, isso é a coisa mais certa: quero trilhar por um caminho de paz, que não me traga desilusões a cada passo, que não me faça chorar sempre depois de sorrir, que não me faça mal, principalmente. E para isso, esse caminho não pode ser seguido por ruas que se cruzam, ele não pode ser ambíguo. É preciso seguir, sempre, na linha que a sua ética e consciência lhe definem.

Por isso insisto em dizer que, muitas vezes, para seguir por um caminho calmo, é preciso abrir mão de muitas coisas. Você está disposto? Nem sempre é fácil. E é bom começarmos nosso caminho carregando essa frase no bolso.

Viver um casamento significa abrir mão de algumas milhares de coisas, da mesma forma que viver uma solteirice feliz, também significa ser privada dos prazeres da vida a dois. Estar junto com alguém significa, antes de mais nada, ser leal a esse alguém. Significa que depois de brigar você precisa solucionar o problema que atrapalha a sua felicidade; significa que você não vai ficar completamente sozinho depois de chegar em casa; significa que você não tem mais uma vida solitária, e isso implica em muitas outras descobertas. Estar só, por sua vez, significa que você pode aproveitar o máximo o seu dia, pode dançar até se acabar a noite, pode beber, rir, brincar, mas vai ter que se acostumar a fazer isso sozinha. Claro que você tem sua família, seus amigos, seus irmãos, mas muitas vezes só isso (e tudo isso) não é o suficiente. Não é demagogia ao casamento: às vezes estar com alguém também pode não ser o suficiente. Esses dias vi um filme que distorcia o ditado “Antes MAL do que SÓ acompanhado”. É mais ou menos por aí.

Escolher uma profissão também é abrir mão de todas as outras. Isso pode ser bom ou péssimo. Sou jornalista, amo o meu trabalho e sou completamente apaixonada por comunicação, mas nunca vou ser a atriz que sonhei ser durante a minha vida inteira. Nunca vou virar, para estudantes, a professora de primário que era para o meu irmão. Nunca vou me tornar a artesã que fazia presentes nas datas especiais. Não serei a psicóloga que ensaiei muitas vezes na frente do espelho nem a nutricionista que disseram que eu levava jeito para ser. Porque fiz uma escolha e ainda tenho muito o que trabalhar dentro dela. Mas também não serei nunca (graças a Deus) a médica que nunca quis ser, a advogada que defende quem não tem razão, a freira que se esconde atrás de um pedaço de pano, a enfermeira que ouve a dor e a contadora mal sucedida. Também escolhi quem não queria ser.

Dar apenas um nome a um filho significa não dar milhares de outros nomes que você escuta todos os dias. Significa que as suas filhas não poderão ter o nome que tinham todas as suas bonecas, e que o nome de todos os galãs também não cabe dentro do seu pequeno menino. Dar nome a um filho significa, quase que somente, lhe delegar uma identidade. Você pode escolher também todos os nomes que você não quer que seu filho carregue para o resto da vida.

A gente nasce cheio de ensinamentos, e desaprendemos ao longo da vida. São coisas que deixamos no caminho, que muitas vezes atiramos ao vento, e que ensinamos aos outros ao mesmo tempo que desaprendemos. Nascemos, também, cheios de medos, de coisas que não temos e que não sabemos, e que vamos adquirindo a medida que conhecemos as pessoas, que aprendemos com a vida, que vamos inventando sonhos.

São perdas e ganhos. O que perdemos e o que ganhamos. O que vamos deixando para trás e o que vamos acumulando. Deixar dores, mágoas e angústias não é problema. Carregar alegrias, sentimentos bons e energias positivas também não. Mas é preciso sempre renovar o filtro. O que estamos carregando vale a pena?

Algumas coisas quero carregar para sempre, outras, como João e Maria, quero aprender e ir atirando no caminho, para que os próximos entendam também, que mesmo o importante, não precisa ser carregado para sempre. Ás vezes, como conta a história, é preciso deixar uma pequena parte para os passarinhos qu chegam a todo momento.



Por Manoela Soares (@manunsoares)


27 de outubro de 2011

Doenças saudáveis

Tem pessoas que passam a vida delas tentando nos tirar de um caminho certo. Elas influenciam quem está próximo de nós, elas empurram verdades que não existem, afirmações que nunca foram feitas, semeiam a discórdia entre nós e um monte de gente que poderíamos vir a gostar não fosse aquela ‘bela’ pessoa permeando as nossas relações.

Eu não sei que nome dão a isso. Mas é algo entre doença e amor. É uma vontade, tanta vontade, que as coisas não aconteçam pra nós, que eles são capazes de fazer amizade com nossos piores inimigos pra nos ver sentindo dor. E o pior, é que eles não desejam nos ver pra baixo, eles desejam nos ver doídos. Aí eles vem, e melhoram a situação. Quase nos fazem apaixonar pelos bons que são. E não fossem meus olhos bem abertos, teria até hoje um ‘amigo’ que nada queria além de me ver na pior. Pra me salvar. Que coisa louca né?

Hoje me deparei mais uma vez com a doença desse coitado, que vive uma vidinha muito mais ou menos por aí, destruindo outras para recuperá-las, para fazer apaixonarem-se. Que bom que meus olhos são bem grandes e de boba eu só tenho a cara.

Quase senti pena dele. Agora mesmo, agora há pouco. Quase senti pena da pessoa que me privou de conhecer outras. Da pessoa que não quis que meus relacionamentos dessem certo. Da pessoa que me tirou de um deles e deu a maior força para os dois lado. Mas isso faz tantos anos. E o coitado não supera.

Quase tive pena do contexto em que ele estará inserido para sempre. Quase tive pena da doença que o assola, e que já me tirou tantas vezes do meu caminho. Quase tive pena de quem daria tudo pra me levantar depois de ter me atirado no chão.

Quase. Mas não tive pena. Vivo muito bem sem pessoas que não torcem por mim. Que vivam eles suas doenças, que eu vivo as minhas: sigo amando incondicionalmente, sigo andando descalça e falando sozinha, sigo caminhando na praia, sigo comendo nos mesmo lugares e trabalhando nas mesmas coisas, sigo com minhas esquisitices e imperfeições. Não tenho medo de rotina, não tenho problema em tentar de novo, e se não der certo de novo, posso errar e conviver com isso. Também não tenho medo de ser pobre, de ter mais de um emprego, de não ter sobrenome de efeito, de ter que trabalhar para ter uma vida digna e ensinar meus filhos que dinheiro não nasce em árvore.

Mas estou perdoada! Estou absolutamente perdoada por mim. Nunca fiz mal, nunca quis mal e nunca desejei mal. Eu não poderia. Conviva com isso quem conseguir e eu sigo com minhas doenças bem mais saudáveis!



Por Manoela Soares (@manunsoares)

25 de outubro de 2011

Eu queria acreditar

Às vezes eu preciso rezar. Sinto falta de acreditar em alguma coisa, de me apoiar sob a fé, de não temer o que não posso mudar e acreditar que existe, sim, algum tipo de justiça, mesmo que não seja no plano dos homens. Às vezes me sinto sozinha sem fé. Me pego quase fazendo uma oração, mas não faço. Implico com as frases prontas, inventadas por outras pessoas, que quase não dizem o que quero dizer, que não traduzem as coisas que eu gostaria de falar. Afinal: rezar é repetir aquelas frases decoradas desde a infância? Então não rezo, eu falo.

Eu falo de noite antes de dormir, principalmente quando estou explodindo de felicidade. Quando sinto que preciso agradecer pelas coisas que tenho, que consigo e até por ainda cultivar sonhos. Falo quando estou com muita saudade de alguém, falo baixinho sobre esse alguém, lembro (e conto) as coisas que já vivemos, rio delas, choro muito. Falo quando chove e não sei para onde vão as crianças que moram na rua enquanto estou bem quentinha na minha cama. Falo quando está vento de arrancar telhado e me pergunto o que faz um pai que acorda no meio da madrugada e descobre que precisa arranjar, naquele momento, um novo lugar para levar seus filhos. Falo quando está tudo bem e quero dizer que está tudo bem, nada demais. Falo quando não estou legal e quando percebo que algumas coisas não me fazem bem e não me tornam melhor. Então falo para talvez afastá-las, falo para tentar acordar uma pessoa melhor no outro dia.

Eu só não sei quem me ouve. Não sei pra quem chegam minhas palavras. Também não sei se preciso saber. Não sei se acredito que existe alguém, de barba sentado numa poltrona majestosa em pleno céu, enquanto estamos aqui em baixo. Não sei se acredito que alguém possa estar presente em todas as coisas sempre, não sei se acredito em alguém que seja capaz de perdoar tudo, não sei se esse alguém cuida de quem já se foi, se existe um outro plano não sei onde. Não sei se existe alguém. Não sei se acredito nisso. E não gosto de não saber no que acreditar, de não conhecer a fé em sua imensidão, de não me permitir sentar num banco de igreja pra rezar e de achar as construções da casa de Deus maravilhosas e luxuosas enquanto vejo pessoas dormindo em soleiras de porta.

Não gosto de não saber no que acreditar, mas também não sou capaz de me permitir acreditar em qualquer coisa.

Acho que estou numa fase de encontro comigo mesma. Um tanto quanto introspectiva e chata, mas paciência. Se eu encontrar também minhas crenças no que está além do que podemos ver e sentir, volto e conto. Por enquanto posso, somente, ser chamada de louca por falar sozinha a maioria das noites.



Por Manoela Soares (@manunsoares)

21 de outubro de 2011

A nova Ela

Não a chame de coisas que você já me chamou. Não diga que ela faz bem as coisas que eu fazia. Não a leve aos lugares que nós fomos. Não prepare para ela a comida que você fazia pra mim. Não espere que ela ria das coisas que você fala: não espere dela um sorriso que você gostaria de ver no meu rosto.
Não dê a ela o meu perfume, o meu disco preferido, não indique o filme que você queria que eu visse. Não passe os dedos pelos cabelos dela, não aperte sua mão como fazia quando queria rir, não construa planos que você sonhou ao meu lado. Não diga a ela o nome que eu queria que nosso filho tivesse. E não dê esse nome a ele.
Não publique ao lado dela os sentimentos que você disse ter por mim, e em hipótese alguma, sinta por ela o mesmo que sentiu por mim. Não a leve a praia, não deite na areia ao lado dela, não procure bicho nas estrelas, não fiquem conversando no carro por horas e horas, até parar de sentir o tempo.
Não espere me ver no reflexo dela. Não queira e não deseje que ela se pareça comigo.
Afinal de contas ela lhe cabe muito melhor do que eu. Ela acompanha suas extravagâncias, aplaude seu ego, torce pelo seu time, come o que você gosta, viaja pra onde você vai, lê o que você acha interessante, assiste o que você decide e joga o seu jogo do início ao fim. Ela luta pra ter você. Ela quer ter a sua vida.
Eu não sou ela. Eu teria e construiria uma vida ao seu lado. Mas eu não abriria mão das minhas coisas e nem viveria a sua vida. Viveria a minha e ela é que caminharia ao lado da sua.



Por Manoela Soares (@manunsoares)

20 de outubro de 2011

Onda

O tempo realmente não é o senhor da cura de todas as dores. Existe o que não pode ser curado, o que não deve ser curado o que não queremos que seja curado. Ainda existem sopros dentro de mim que insistem em fazer doer mais e mais o que o tempo não consegue afastar , o que a cabeça insiste em pensar, o que as fotos insistem em lembrar. Ver foto pode ser triste. É quase como reviver aquele momento, aquele instante que não volta mais, é quase como poder tocar, como poder beijar, é quase como sentir de novo aquele abraço, aquele cheiro. Quase. Mas não é.



Por Manoela Soares (@manunsoares)

19 de outubro de 2011

O que importa e o que não importa

Essas são as duas únicas coisas que existem: o que importa e o que não importa. Se a morte pode nos alcançar a qualquer momento, pra que viver a vida se importando com coisas que não trarão o mínimo de relevância para as nossas vidas?

O que importa é a profissão que a gente escolhe. É a paixão e a vontade de acordar todos os dias para trabalhar no que escolhemos. O que importa é se reinventar, não se deixar levar por números e estatísticas, é tentar ser sempre melhor, não que os outros, melhor que nós mesmos. O que importa é conseguir as coisas por esforço, é nunca ter que desacreditar dos nossos valores para acreditar no nosso trabalho, é nunca, em hipótese alguma, passar por cima de alguém que esteja a nossa frente.

O que não importa é o que os outros desprezam daquilo que a gente faz com amor e responsabilidade. Não importa que a teoria esteja escrita em um milhão de páginas se, na prática, a gente já sabe que não vai dar certo. O que não importa é o que as pessoas pensam (de ruim e injusto) da nossa profissão. Não importa que outros queiram ser melhores. Não importa que a gente reconheça que outras pessoas sejam melhores. Uma coisa é certa: sempre, mesmo, vai existir alguém melhor. E isso não é demérito nenhum. O que não importa, pra ninguém, é você mesmo achar que seu trabalho é bom. Deixe que os outros te reconheçam.

O que importa é preservar os velhos amigos. Os que brincaram de esconde-esconde com a gente. Que nos viram nos momentos mais difíceis, os que acompanharam os momentos mais legais. O que importa é ter uma foto deles em casa, não deixar que a rotina os distancie, que o trabalho sempre atrapalhe os planos, que o cansaço os impeça de aproveitar a vida. O que importa é permitir que essas pessoas te amem independente do que você escolheu ser. E amá-las mesmo que não concorde sempre com o que elas façam. O que importa é respeitar. E ser respeitado.

O que não importa são aquelas caras de nojo que te olham na rua. Aqueles comentários que tem destino certo, as provocações que já não fazem sentido. Não importa que as pessoas não gostem de quem você é, do sobrenome que você tem, na casa onde você mora. Aliás, não importa mesmo nem o sobrenome que você tem, nem a casa em que você mora.

Importa que a sua família saiba que tem você por perto. Importa que os laços que os liguem sejam mais fortes que apenas laços de sangue e que não falte palavra de carinho, amor e orgulho. O que importa é que você sempre reconheça que ninguém chega a lugar algum sozinho. Que seus pais são grandes responsáveis por você ser quem é, e que suas escolhas refletem seus valores.

O que não importa é que se tenha problema, que se sofra de vez em quando, que se passe uma semana inteira com nó na garganta. Não importa que as coisas nem sempre dêem certo, ou que você não ache que ganha o que devia ganhar, ou que você faz muito mais do que precisa fazer. Também não importa que seu carro não seja o modelo do ano, que seu cabelo e seu corpo não sejam exatamente como você gostaria que fossem, que sua memória não ajude como deveria, e que seu humor não se esconda atrás de um sorrisinho amarelo.

O que importa é tirar proveito de tudo o que se vê e se vive. É entender que os dias passam, as noites também, e que nada é tão importante a ponto de fazer você cogitar desistir.

O que não importa é que alguém diga que você não consegue. Ou que você não deveria tentar.

O que importa é apenas tentar, mesmo que nada dê certo. As conseqüências não são algo que estejam ao nosso alcance. E o que importa é trazer para mais perto as coisas que nos são caras.



Por Manoela Soares (@manunsoares)

13 de outubro de 2011

Fazer dar certo

Eu assisti esses dias ao filme “A razão do meu afeto”, que conta uma linda história de amor, sem final feliz, e, cheia de semelhanças com a realidade. Ou não. O filme trata de uma ideia que pode ser considerada normal ou louca, depende do ponto de vista de quem vê. Mas enfim. Lá pelas tantas, em meio a uma séria discussão, Jennifer Aniston desabafa ao amigo, pelo qual é apaixonada:

- Você precisa escolher alguém para viver, e fazer dar certo!

Não preciso dizer que, se histórias de amor que terminam bem me fazem chorar, imagine só as que não dão certo. Bom, mas enfim. Depois de chorar, me deitei, e comecei a pensar que todas as coisas a nossa volta dependem somente de nós. Pelo menos a maioria delas. E nos esforçamos, ou pelo menos precisamos nos esforçar, se queremos que elas dêem certo. É assim com tudo. Mas quase nunca fazemos isso em relação ao amor.

Tudo o que fazemos exige muito esforço. Todos nós, para sairmos do colégio, estudamos pelo menos 13 anos. Vendo de matemática a história, passando pela física e química: isso não é fácil. Depois passamos por um vestibular, e os que quiseram um curso bem concorrido que me ajudem: não é fácil. Ficar sem sair final de semana, sem namorar, sem ver os amigos, sem pelo menos ver um bom filme porque tem que estudar, que entregar um trabalho, que terminar o TCC, que tabular alguns dados de pesquisa, que corrigir prova de aluno também não é fácil.

Levar uma vida ‘normal’ não é moleza. Acordar todos os dias, se vestir, ficar no mínimo 8 horas exercendo as funções de sua profissão e ainda encarar hora extra toda a semana não é pra qualquer um. Lavar a roupa, a louça, fazer comida, manter a casa limpa e ainda cuidar dos filhos não é tarefa fácil. Cortar a grama, limpar a piscina, podar árvore, passear com o cachorro, arrumar o chuveiro, limpar o carro, trocar o piso do pátio não é fácil. Não é fácil ter uma vidinha normal de trabalhador ou dona-de-casa. Precisamos nos esforçar para fazermos dar certo.

Aí chegamos em um relacionamento e nos portamos como se não tivéssemos aprendido nada sobre dificuldade. Manter um relacionamento bem, também não é uma tarefa simples. É preciso “escolher alguém pra viver” e depois disso, ainda é preciso o essencial: “fazer dar certo”. Precisamos fazer dar certo todos os dias quando acordamos. Precisamos fazer com que nosso mau humor não nos consuma a ponto de desestabilizar nosso relacionamento. Precisamos queres estar do lado de quem estamos, e conseguir se imaginar com aquele mesmo rosto, rodeado por netos daqui há 60 anos. Precisamos fazer dar certo a cada ano que completamos aniversário juntos, a cada beijo, a cada abraço. Estar junto há 3 meses pode ser bom, há 3 anos pode ser muito bom e há 30 anos pode ser melhor ainda. Vai da competência de cada um de fazer dar certo.

Uma vez uma amiga que disse que o segredo do casamento não é esperar que o outro nos faça feliz. Mas fazer o outro feliz. Queremos a todo momento que nossas vontades sejam supridas, que nossos desejos se realizem, que as coisas andem pelos caminhos que escolhemos. E queremos que alguém acompanhe nossa insanidade sempre. Se nos preocupássemos apenas em fazer o outro feliz, e o outro pensasse o mesmo, além de manter um bom relacionamento, acho que poderíamos nos tornar, também, pessoas melhores.

E se ser quem a gente é, é difícil, imagine só, ser melhor.



Por Manoela Soares (@manunsoares)

11 de outubro de 2011

Sim - Cris Guerra

Li Cris Guerra pela primeira vez através do Livro “Para Francisco”. Depois topei com o “Hoje Vou Assim” e nunca mais parei de ler Cris Guerra. Eu gosto de palavra estranha. De frase que pode não nos gerar sentido mas que faz pensar que significa muito pra outro alguém. Gosto de como algumas pessoas transformam lágrimas em palavras bonitas. Já tive que transformar as minhas e esse também foi o meu caminho: escrever. Gosto de como ela gosta de quem é. Como está satisfeita consigo mesma. Como se dedica a um projeto audacioso e divertido e como fala dele com orgulho. Gosto da história que virou livro. Gosto de como ela conta a história. Gosto de quem me arranca lágrimas por beleza e simplicidade. Indico “Para Franciso” a torto e a direito. A maioria das minhas amiga já leu, e espero que sigam lendo. Que comprem, que tenham em casa e que guardem abaixo de sete chaves a história de amor de três pessoas conectadas somente pelo amor. Eu gosto da forma como pessoas como ela, ainda falam no amor. Com vocês, Cris Guerra.

“Sim.

Eu já sonhei ser modelo. Depois atriz. Depois cantora. Qualquer coisa que me colocasse num palco. Sim, fiz curso de modelo, depois curso de TV, depois aula de canto. Mas tudo isso durou pouco.

Não fui atrás de nenhum desses sonhos. Fui escrever sobre tudo isso e virei redatora de anúncio. Nisso, persisti.

Não persisti nos meus outros sonhos porque me escondi atrás do meu nariz torto, dos meus dentes imperfeitos, das minhas pernas finas, do meu cabelo ondulado, da minha voz aguda e da minha língua presa. Sim, tudo isso ainda faz parte de mim. Não fiz plástica, não usei aparelho, não coloquei silicone, não fiz musculação, nem escova progressiva, nem fonoaudiologia. Mais tarde, a essas imperfeições vieram se juntar varizes, estrias, celulite, olheiras, cabelos brancos e uma barriguinha.

Sim, eu tenho um filho. O que reforça as olheiras. Mas nesse contexto elas perdem por completo a sua importância.

Sim, eu tenho 37 anos.

Não, eu não uso maquiagem. Talvez porque ao longo do tempo eu tenha aprendido a me aceitar assim, quase exatamente como sou. Talvez porque eu me ache, hoje, mais bonita do que realmente sou. Talvez porque eu não fique esperando a opinião do outro para me sentir assim. Quando eu me olho no espelho, fico feliz no papel de mim mesma.

Sim, eu gosto de aparecer. Isso me diverte e me faz levar a vida menos a sério.

Não, atualmente eu não pratico esportes. Porque sou preguiçosa também.

Sim, eu tenho muitas roupas. Sou consumidora compulsiva. Ainda estou me curando. Lentamente, que é como as verdadeiras curas funcionam. E a cura está em expor meus exageros, transformando o vício em uma coisa boa. Sim, eu já gastei demais, já me endividei, já sofri por isso. Já me culpei. Depois descobri que me culpar só me faria insistir no vício. Sim, eu me perdoei.

Sim, eu já sofri por amor. Muitas vezes. Já fiz sofrer também. E já perdi mãe,pai, avós, filhos no início da gestação. Sim, eu já me separei. E foi bom. Sim, depois disso encontrei o amor da minha vida e o perdi de um dia para o outro. Não, não foi fácil. Mas reencontrei a alegria. Não morri com ele.

Sim, eu só tenho a agradecer. Porque amei e fui amada. Porque temos um filho que ao sorrir me mostra que valeu a pena. Sim, faltaram algumas coisas – mostrar Paris para ele, por exemplo. Faltou ele conhecer o próprio filho. Mas sobrou amor. E não faltou dizer nada. Nem ouvir.

Já vivi muitas coisas. E não me canso de me surpreender com a vida. Sim, para melhor.

Sim, eu me sinto sozinha. Mas não me assusto mais com isso. Tenho me achado ótima companhia.

Sim, eu me orgulho. Não das minhas perdas, mas da maneira como lido com elas. E de estar completando 24 anos de auto-análise. Desde os 13 escrevo sobre a minha dificuldade de estar no mundo. Tanto tempo, que foi ficando fácil. Já fiz as pazes comigo e com o mundo.

Sim, eu sou a filha mais nova de uma família de cinco. E fui mimada. E já fui insuportável. Não, eu não era ouvida. Eu me sentia abandonada. Só falava em tom de choro. Sim, eu me sentia feia. Sim, eu cortei os cabelos pela primeira vez aos 19 anos e nunca mais deixei crescer. Porque isso me libertou. Sim, foi uma alegria descobrir que a beleza estava dentro de mim, e não nos cabelos.

Sim, eu me tatuei 29 vezes. Isso também me liberta e me ajuda a levar a vida de um jeito mais leve.

Sim, eu gosto de me vestir bem. E demorei muito tempo para entender que isso era prioridade pra mim.

Sim, eu gosto de moda. Não a moda ditada pelo último São Paulo Fashion Week. Gosto de moda na coleção que eu mesma lanço ao fazer minhas escolhas. Gosto do desfile que começa a cada dia na hora de me vestir. Sim, essa é a minha forma de fazer moda.

Sim, eu poso de modelo. E me mostro, sem medo. Não, as fotos não têm retoque de photoshop. E eu não tenho uma equipe para me vestir nem para me maquiar. Sim, tenho amigos talentosos que topam a minha viagem todos os dias. Sim, tenho sorte.

Sim, eu gosto de aparecer. E adoro elogios. Eles fazem do outro o meu espelho e isso é muito bonito. Sei elogiar também. E sempre que o faço, é sincero.

Sim, estou em lua de mel com a modelo que existe em mim. Que tem olheiras, varizes, cabelos brancos e nenhuma maquiagem. Sim, estou em lua de mel também com a escritora que existe em mim.

Sim, eu convivo diariamente com uma ou outra frustração. E nenhuma é grande o suficiente para me fazer infeliz. Sim, eu vejo pessoas à minha volta. E muitas delas sofrem também. E a gente troca.

Sim, de vez em quando sinto inveja. Mas quando isso acontece, procuro a saída mais bem-humorada. Sim, é muito bom quando você consegue dar ao outro apenas o melhor que está em você.

Sim, eu ouço som bem alto no carro. Coloco os óculos escuros e canto a caminho do trabalho. Sim, hoje atraio olhares. Nem todos são bons. Mas aprendi a lidar com isso.

Sou triste e sou alegre. Sim, sou eu.

Sim, eu sou mulher. E sou modelo, atriz, cantora. Trabalho num lugar onde posso exercer tudo isso. Construí meu próprio palco.

Sim, eu me acho poderosa. Mesmo porque, é comigo que posso contar. Sim, em alguns momentos percebo que a imagem que involuntariamente construí é diferente de mim. Mas é parecida também. E eu não tenho controle sobre isso.
Não, hoje não tem foto. Hoje vou assim. Vestida dos meus sins e dos meus nãos. Vestida de mim mesma. Praticamente nua. Livre de falsas identidades e convidando você a se libertar também
"

9 de outubro de 2011

Para Helena


‘Eu te desejo não parar tão cedo, pois toda idade tem prazer e medo. E com os que erram feio e bastante, que você consiga ser tolerante. Quando você ficar triste que seja por um dia e não o ano inteiro. E que você descubra que rir é bom, mas que rir de tudo é desespero. Desejo que você tenha a quem amar e quando estiver bem cansado ainda exista amor pra recomeçar






Mana,
Hoje é o teu aniversário! Estás fazendo sete anos. Como tu mesma diria: “Uma mão cheia e mais dois dedos”. Acredite Helena, isso é bem pouco. Que bom! Um dia tu vai entender que é bom mesmo, por enquanto sei que queres logo alcançar as ‘duas mãos cheias’.
Sabe mana, eu sempre tive um único irmão. Até meus 15 anos. Sempre achei pouco, mas me acostumei com a ideia de ter um natal pequeno quando fôssemos adultos: nós dois e nossas famílias. Não passaríamos de 10 pessoas. Isso sempre pesou muito porque tive uma infância com natais bem grandes, com muitos primos e tios e eu ficava me perguntando se meus filhos esperariam tanto por essa festa como eu esperava quando era pequena. Um dia tu vai entender essa mania que a tua irmã tem de pensar num futuro bem distante. Enfim. Dividi meus brinquedos, minhas canetinhas, minha vontade de crescer, meus desenhos, meus livrinhos e até meu quarto, com o Maurício. Sempre fomos nós dois.
Ao mesmo tempo que tua chegada foi esperada, eu confesso que tive medo. Não sei se com filho é assim, se temos medo de não amar tanto o segundo quanto amamos o primeiro. E eu já tinha um irmão quando te conheci. Tinha há 15 anos. E tive medo por nós. Por mim e por ele.
Tu chegaste de mansinho, bem pequena, bem vermelha, bem feinha (como todo nenê diga-se de passagem). E aos poucos foi conquistando espaço dentro do meu coração. Entendi e aprendi a te amar mais e melhor a cada dia. E tu fizesse de mim uma pessoa melhor. Quero ser tua parceira, quero ser pra quem tu vai contar teus segredos e dividir tuas angústias, quero te ajudar a crescer e te aconselhar quando achar que devo. Não pude ser essa pessoa para o Maurício. Temos pouca diferença de idade, nunca fui tão mais experiente do que ele. Às vezes me surpreendo com a forma madura como ele me dá uma notícia: eu também aprendo sobre maturidade com ele.
Entendi que entre nós nasceria um amor diferente.
E não só nasceu, mas esse amor cresceu de forma diferente. É um amor que ainda não senti igual, porque é diferente até mesmo do amor que sinto pelo Maurício e do amor que sinto pela Isadora. Temos uma cumplicidade que transcende os 15 anos que nos separam, um respeito que pode ser visto através do nosso olhar, diferenças que nos complementam, conversas que nos aproximam, presenças intensas capazes de sanar o tempo que ficamos sem nos ver.
Quando te vejo fazendo o tema, vendo desenho, cuidando da Isa, respondendo com propriedade, impondo tuas vontades, competindo com outras ginastas, inspirada por uma profissão, ensinando passos de dança, cantando músicas novas, olhando o mano como quem olha um super-herói, correndo, pulando, brincando, percebo quantas semelhanças nos unem e quantas diferenças nos fazem ficar ainda mais juntas.
É claro que tu não vai ler essa carta agora. Mas eu prometo que te mostro ela daqui há uns 10 anos mais ou menos. Prometo!
Queria mesmo que nesse aniversário eu te desejasse muito mais do que felicidades, quero estar ao teu lado pra te ver feliz. Mais do que amor, quero participar dos teus amores e, se não for muita petulância, quero ser um deles pra sempre. Muito mais do que sorte, quero que conquistes teu espaço por competência e vontade, e ainda quero conversar muito sobre isso contigo.
Enfim, quero que saibas que tens uma irmã babona, que te ama como mãe, que te quer bem e feliz mais que qualquer outra coisa. Que te deseja sim, um monte de presentes, mas mais do que isso, te deseja presente. Pra sempre.
Quero que faças parte dos meus natais e aniversários e dias de festa ou de choro. Assim são as relações mana. Elas são complexas e simples. Elas são fáceis e exigentes. Elas são belas e escabeladas. Exatamente como nós. Né? “Complicadas e perfeitinhas”
Somos muito parecidas mana, vamos achar ainda mais semelhanças no futuro. Hoje vejo isso com mais clareza. E como é que diz aquele passinho que tu me ensinou?



Nós andamos iguais, nós andamos iguais. De um lado pro outro. Pra frente e pra trás. Nós andamos iguais






Te amo incondicionalmente, minha princesa!







Por Manoela Soares (@manunsoares)






4 de outubro de 2011

Onde foi parar o tempo?

Não está acontecendo só comigo. Todo mundo só fala nisso:

- Eu não tenho mais tempo pra nada!

Estamos sempre tendo que nos justificar com alguém ou para alguém. “Desculpa por não ter conseguido ir”, Com o prazo que tinha não deu pra fazer”, “Eu não vou poder me comprometer com isso porque estou realmente com muitas outras coisas pra fazer”, “Eu não tive tempo”.

E não estamos falando por mal, não estamos deixando de fazer por falta de vontade, não estamos deixando de ver por opção. É que corremos o dia inteiro. Quer ver só?

Geralmente, já acordamos atrasados. Isso porque ninguém acorda às 5 horas da manhã por opção. Então acordamos, nos espreguiçamos, colocamos no soneca e viramos pra lá e pra cá na cama até a hora de levantar mesmo. Ou, para aqueles que são contra o soneca, como eu, quando o despertador toca é levantar ou levantar. Um minuto a mais na cama e tudo estará perdido. Lavamos o rosto com pressa. Ligamos a televisão para ter companhia, para ouvir uma vozinha ao fundo dessa correria louca. Engolimos o café, escovamos os dentes, colocamos o sapato e saímos pela porta com o horário apertado. A hora certa de chegada pode (sempre) variar cinco minutos para mais ou para menos.

Se vamos a pé, aproveitamos a ida para escutar música; sabe-se lá que horas teremos outras oportunidades de cantarolar. Se vamos de ônibus aproveitamos para botar a leitura em dia. Ou o sono em dia. Mas enfim, a moral é não perder um minuto sequer de nada. Fazer nada não é algo a se pensar, pelo menos até o final do expediente. Ou depois.

Chegando ao trabalho nem se fala, não é possível falar (e até mesmo pensar) outra coisa que não o próprio trabalho.

E quando acaba, acabou. A gente quer mais é ir pra casa, tomar um banho e descansar. Cada um do seu jeito: seja vendo televisão ou lendo ou escrevendo ou no computador, enfim. E quando a gente vê, está na hora de dormir. E acabou. Esse foi o dia. Amanhã, se não for igual, vai ser ainda pior. Mais trabalho, mais ligações, mais planejamentos, mais correria, mais imprevistos, mais incertezas e menos tempo. Cada vez menos tempo. Quanto mais se pensa no que se quer fazer, menos se tem tempo para colocar esse pensamento em prática.

No final de semana, quem tiver muita sorte, consegue descansar. Ficamos felizes quando conseguimos, pelo menos, dormir até mais tarde no sábado e no domingo. Isso já quase basta.

Onde ficam as viagens de final de semana, os encontros no final da tarde, a conversa com os nossos amigos, o passeio com o cachorro, o cinema com o namorado, o tempo livre com os irmãos, a visita às avós, os banhos de sol, os banhos de creme, os banhos de mar, os banhos de loja, a caminhada, a academia, a ida a padaria, o tempo para assistir àquele filme, o piquenique, a arrumação das unhas?

Onde foi parar aquele tempo, no qual nos encontrávamos, quando o natal demorava pra chegar, quando nosso aniversário parecia ser comemorado de quatro em quatro anos, quando as férias duravam uma eternidade, quando os anos eram separados por 365 dias bem vividos?

Às vezes me pergunto se estou sabendo viver certo. É assim mesmo? Quando finalmente paramos para pensar faz mais de seis meses que ficamos de ligar .. para quem mesmo? Será que é por isso que a gente corre? Pra não lembrar?

Queria saber onde foi parar o tempo, todo o tempo que eu tinha, pra viver de verdade. Pra conseguir sentir a intensidade das coisas. E para ver as coisas acontecendo.

Se alguém encontrar, por favor, me avise.



Por Manoela Soares (@manunsoares)

2 de outubro de 2011

Diálogo

Domingo de sol, eu e a Helena no pátio de casa 'brincando'

Helena - Mana, vamos brincar que tu era um cavalo?

Eu baixo a sobrancelha e aperto a boca, entendendo que as minhas costas estão com os dias contados.

Helena - E eu podia ser a menina que cuidava dos cavalos. Vamos?

Eu - Vamos!

Ela sobe nas minhas costas e começa

Helena - Vamos cavalo, depressa! Precisamos acher umas flores muito raras que tem lá na frente e eu não sei onde ficam.

Claro que, como um bom cavalo, eu vou correndo com ela na garupa até a frente de casa. E aí começa nossa conversa

Helena - Mana, eu tinha um monte de cavalos tá? Faz de conta. Só que tu era branca e era rara, meus outros cavalos eras pretos e daí, às vezes, tu chorava porque ninguém queria brincar contigo porque tu era bem branquinha, duma espécie bem rara. Tá?

Eu - Tá!

E seguimos correndo e buscando flores, e pesquisando elas, e correndo, e correndo, e correndo. Até que ela disse

Helena - Tem certeza que tu quer ser preta?

Eu, que tinha esquecido que era só um cavalo, perguntei

Eu - Como assim mana, quero ser preta?

Helena - É o cavalo lembra? Que fica triste porque não é preto que nem os outros.

Eu - Ah é! Eu queria Helena, ser preta que nem os outros cavalos pra eles brincarem comigo.

Helena - Mas não precisa. É justamente a sua diferença que faz de você um cavalo tão especial!


Onde é que ela aprendeu isso? Claro que a irmã babona quase começou a chorar ali mesmo.

E a menina, que cuidava dos cavalos, fez um carinho bom no seu cavalo diferente, e eles seguiram correndo, como sempre.

E tem gente que acha que não tem mais nada pra aprender. Valeu meu dia!



Por Manoela Soares (@manunsoares) vulgo 'cavalo branco'

27 de setembro de 2011

Quase

Nem sei quanto tempo faz que escrevi esse texto. Novo e velho!


"Ele prometeu que voltaria. Deixou tudo como estava dentro do coração dela e se jogou no mundo para viver e aproveitar a vida que não tiveram juntos. Ela disse que tudo bem, esperaria o tempo que fosse. E com a alma colorida e de peito aberto se reergueu desejando sempre uma volta. Ele, de vez em quando ligava; não queria perder completamente o contato com aquela que julgava ser o amor de sua vida. E ela, cheia de esperança, atendia as ligações que não duravam muito mais que meia dúzia de palavras bonitas, mas vazias. Banhado em lágrimas, o telefone era abandonado novamente.

E ele se apaixonou. E ela encontrou alguém. E eles quase deixaram de existir. Quase. Não fosse essa maldita mania humana de tratar o passado como um ente querido. E eles tiveram saudade. E eles muitas vezes se encontraram. Mas eles, não existiram mais. Ou quase.

E entre comparações e saudade ela pensou que fosse enlouquecer, com esse novo alguém que quase substituiu o outro amor. Quase. Ela viveu por anos pensando o que ele estaria fazendo, quem levava a seu lado pela mão, se ainda detestava limpar a casa. Mas prolongava sua estada com essa nova pessoa que, afinal de contas, a fazia sentir-se bem.

E ele, ah ele, ele andava pelo mundo arrancando suspiros e sorrisos desavergonhados os quais nunca recebeu dela. Ele via a vida de forma muito mais interessante agora, apesar de sentir falta dela. Mas ela e a nova vida simplesmente nunca andariam a mesma trilha. Então, ele optou por ele mesmo.

Ela sentia frio na barriga ao vê-lo passar bem longe. Mas era seu novo amor quem a abraçava e cuidava quando faltava colo. Mesmo assim, quando o beijava, ao fechar os olhos, imaginava ele. Que poderia ser ele. Que seria ele. Que aquele beijo era dele.

E ele sentia-se tão bem ao vê-la sem fôlego na sua presença que chegava a instigar sua vontade de estar junto de novo com uma nova mensagem, que só embaralhava mais a cabeça dela. E a vontade de estar junto era tanta que nos sonhos, sempre havia uma possibilidade de fugir. Mas ela sempre se arrependia e voltava. Eles quase ficaram juntos para sempre em sonho. Mas não conseguiram.

Foram se passando os anos, as notícias vinham, abalavam, passavam, vinham, se confirmavam, passavam. Ela tinha certeza de que o que eles sentiam não havia acabado enquanto seu novo amor pensava construir um lar. Ela gostava da pessoa com quem dividia a vida e tinha certeza de que, se pudesse, a escolheria. Mas já não era uma questão de escolha aquela história com ele acabava a engolindo aos poucos e levando sua vida, sua oportunidade de ter filhos, seus sonhos de refazer a casa que eles haviam planejado.

Ele quase voltou várias vezes.

Ela quase ligou todos os dias durante todos os anos.

E assim eles ficaram, quase sem saber um do outro, deixando a história que poderia ter um belo ponto final se arrastar por anos e anos sem nunca saber se alguém vai terminar de escrevê-la.

Eles nunca mais se falaram. Então ela ainda achava que havia algo para resolver entre aqueles corações. Ela tinha certeza de que, se eles se encontrassem, o amor ressurgiria do peito que nunca deveria tê-lo deixado ir. Eles quase se encontraram.

Um dia ela acordou diferente. Depois de passar anos sem notícias dele, já não existia mais nada a ser resolvido. Sua vida estava ali a um passo. Só faltava ela pisar, era só colocar o pé no chão. E ela colocou. Num piscar de olhos as coisas fizeram sentido. Seu amor estava a sua frente, sua casa quase pronta, sua vida tomando o rumo que ela sempre sonhou, e ela estava feliz. Estava, sem se dar conta, feliz de verdade. Quase teve medo dessa felicidade sem ele. Mas pisou fundo o acelerador e correu pra resolver as pendências que haviam passado a sua frente durante e ela não segurou. Se arrumou mais, penteou o cabelo de um jeito novo, saiu na rua quase que dizendo muito prazer aquele céu que insistia em não reparar. Beijou apaixonadamente seu ‘novo amor’ que no fim das contas, não tinha nada de novo. Ela mesma o pediu em casamento.

Analisando sua vida hoje ela sente um frio só de pensar que as coisas poderiam ter sido diferentes. E elas quase foram. Quase."



Por Manoela Soares (@manunsoares)

25 de setembro de 2011

O que vi da vida

O que vi da vida é o nome da nova série do Fantástico, onde os artistas falam de carreira, família, desafios, perdas, desejos .. enfim. Não assisti a todos, confesso, mas o nome do quadro me inspirou. Por si só. Primeiro porque eu adoro frases que me soem estranho, que rimem sem letra, que façam pensar sem querer. Depois porque vemos muitas coisas. Todos os dias. Cena que nos chocam, que já se tornaram comuns, que nos arrancam sorrisos, que nos arrancam lágrimas, que nos fazem escrever, que nos fazem parar. Quantas dessas cenas continuam na nossa memória? Quantas realmente nos marcam? Quantas vão ser as coisas que vimos, e por traz desse vimos, que sentimos e por isso levaremos como as coisas que vimos da vida?

Pois bem. No auge dos meus 22 anos de pura experiência me atrevo a falar sobre o que me desperta sorriso ou fúria, medo ou raiva, choro ou riso. O que vi da vida?

Acho que antes de tudo descobri o amor. Pelos olhos que me cuidavam de longe, pelas mãos que me ensinavam a andar, pelos beijos de boa noite. Depois, enquanto a barriga da minha mãe crescia, aprendi que o amor nem sempre pode cuidar. Às vezes ele precisa ser cuidado. E entendi o amor que não via, que não tocava, que sequer conhecia o nome. E com esse amor aprendi a esperar.

Depois, ou durante mesmo, devo já ter entendido a amizade. A importância da cumplicidade de pessoas que se gostam, apóiam e amam por uma questão de escolha. Vi que a vida é como onda, que leva e traz pessoas a todo o momento. Todas te modificam de alguma forma, todas foram amigas em algum momento. Mas poucas ficam anos perguntando como foi o seu dia. Poucas dizem o que realmente devem dizer e na hora certa de dizer. Poucas não fingem gostar do que não gostam pra te agradar, mas tem um ombro a disposição sempre que você precisa de colo. E por isso, aprendi a selecionar. Então lidei com mentiras, rasteiras e traições mas também descobri muito mais amor do que podia imaginar caber entre duas pessoas que não tem o mesmo sangue.

Não sei em que altura vi que a vida me exigiria, então eu mesma comecei a me exigir. Não precisava ser a melhor, muitas vezes preferia mesmo que nem fosse, mas tinha que ser diferente. E quando eu entendi que o diferente também tem seu valor, passei a dar muito mais respeito às pessoas e a sorrir a todos os que me cumprimentavam, fossem eles conhecidos ou não.

Vi que a vida não pode ser sempre levada a sério, e descobri um deboche que me faz sobreviver a situações em que pular do 15º andar parece realmente a melhor opção. E comecei a rir mais de mim mesma, a debochar de mim mesma, a falar sem vergonha na minha frente sobre as minhas esquisitices para quem sabe um dia arrumá-las. E vi que para a grande maioria das situações, rir é realmente, uma boa saída. Para um sim ou um não, uma boca cheia de dentes pode dar conta do recado.

Enfim, falando de tudo e não falando de nada, vi que as dores, por maiores que sejam, sempre passam. Sempre. Nós é que precisamos permitir que algumas dores se vão. Já vi pessoas mais apegadas as suas próprias dores do que à pessoa para qual a dor está destinada. A dor está sempre ligada a alguém. Então coloque esse alguém em um novo cenário, de um simples amigo, companheiro, conhecido ou até desconhecido que seja, mas destine a ele uma nova incumbência e não sofra pelo fim da dor.

Palavras têm memória. Isso é uma das coisas mais importantes que aprendi. Nada e falado apenas naquele momento.

Saudade não poderia mesmo ser traduzido para outra língua, porque mesmo no português ela traz um nó na garganta inexplicável.

Eu vi tantas coisas, eu senti tantas coisas, eu quis tantas outras.

O que eu vi, afinal da vida? Vi o amor, a amizade, a dor, a saudade, a cumplicidade, a ingenuidade, a simpatia, o rancor, o medo, a falta, a presença. E vi tudo isso convivendo em harmonia dentro de um mesmo ser.



Por Manoela Soares (@manunsoares)